Lotação em excesso no Metrô |
Horas perdidas dentro de um ônibus ou Metrô lotado para ir e voltar ao
trabalho, falta de estrutura na saúde pública, insegurança, escolas
ruins e impostos altos.
Essa combinação enfrentada diariamente por grande parte dos paulistanos
tem feito com que qualquer problema seja a última gota para um
protesto generalizado.
Os constantes ônibus queimados por causa da violência e o confronto
entre seguranças e passageiros na Linha 3-Vermelha do Metrô na última
terça-feira são exemplos de situações que mostram que o cidadão está
cansado de ser tratado como lixo.
O Diário de SP traz histórias de paulistanos que precisam enfrentar todos os
problemas que surgem no dia a dia, além de seu próprios aborrecimentos
pessoais, para conseguir viver na maior cidade do país. Essas pessoas
muitas vezes estão sem paciência para desculpas que os governos dão e
promessas não cumpridas. Aí decidem agir por conta própria.
Em junho de 2013, boa parte dos paulistanos foi às ruas protestar e
exigir melhoras em alguns setores, como transporte, saúde e segurança.
Em algumas manifestações aconteceram atos de vandalismo. Para o
cientista político e professor da PUC-SP Pedro Fassoni Arruda os protesto podem ser entendidos como uma
resposta à displicência diária do poder público com os cidadãos.
“Um pedaço da vida das pessoas é perdida na fila do transporte público. E
a culpa é dos governos municipal, estadual e federal”, disse o
professor.
Para ele, a população se sente como se estivesse com um nó na garganta
por preocupação, que vai da falta de uniformes escolares ou falta de
vaga nas creches até a ausência de médico nos postos.
Todos esses transtornos vivenciados pelas pessoas podem causar
distúrbios mentais. Cada pessoa reage de uma forma diferente quando o
nível de tolerância se esgota. Alguns guardam para si e depois acabam
desenvolvendo depressão e outras doenças psíquicas.
De acordo com dados divulgados, em agosto de 2013 pela OMS, 30% dos paulistanos sofrem de algum
transtorno metal.
“O paulistano vive no seu cotidiano uma situação de violação de
direitos, muitas vezes por omissão do estado. Toda a forma de sofrimento
mental tem relação com aquilo que o ser humano vive no dia a dia”,
afirmou Elisa Zaneratto Rosa, psicóloga e presidente do Conselho
Regional de Psicologia de São Paulo.
‘Se ele estiver com algum problema vou ter de esperar’
A dona de casa Mônica Rocha Alves, de 29 anos, conseguiu fazer com que o
filho, Daniel Alves de Souza, de apenas 1 mês, realizasse o teste do
pezinho (cujo nome correto é triagem neonatal e pode identificar até 30
doenças genéticas, metabólicas e infecciosas), mas vai ter de esperar
até abril para saber se está tudo bem com a criança. “Na UBS só marcaram
consulta para o dia 23 de abril. Se ele estiver com algum problema, vou
ter de esperar até lá para saber”, contou Mônica. Enquanto não sabe o
resultado do exame, a dona de casa passeia com o filho e visita casas
de parentes. Para ir do Jardim Peri, onde mora, na Zona Norte, até a
Vila Rosa, na área do Horto Florestal, também na Zona Norte, ela pega
três ônibus com o bebê. “Vai cheio e faz muito calor porque nunca tem
ar-condicionado, mas pelo menos me deixam sentar quando veem que eu
estou com um bebê”, disse Mônica. A próxima preocupação da dona de casa
vai ser entrar na fila da creche para o menino, assim como fazem outras
milhares de mães na cidade.
‘Não quero que a morte do meu filho fique impune, descobrirei quem foi’
Líder de limpeza em uma empresa, Maria José Marinho, de 45 anos, acorda
todos os dias por volta das 4h para entrar às 6h ao trabalho. Apesar de
ser bastante cedo, a lotação que ela tem de pegar perto de sua casa, no
Jardim Paraná, região de Vila Nova Cachoeirinha, na Zona Norte da
capital, para ir ao trabalho, na Barra Funda, Zona Oeste, vai sempre
lotada. Na sexta-feira, que era seu dia de folga, aproveitou para levar
de ônibus a cachorra poodle Nina, que vomitava sangue, ao veterinário.
Só para deixar a cachorra e tratá-la no local, vão ser R$ 500 dos R$ 800
que ela ganha mensalmente. Um esforço que vale muito, já que Nina é sua
fiel companheira, pois seu filho, Geraldo, então com 20 anos, foi
assassinado ainda não se sabe por quem no ano passado. “Eu o achei no
IML. Eu não quero que isso fique na impunidade. Vou pegar o processo do
meu filho e ir até o fim para descobrir quem foi”, disse Maria José.
‘No Hospital de Taipas quase não tem médico’
O montador de móveis e pisos Antônio Gomes de Oliveira, de 50 anos, mora
em Parada de Taipas, na Zona Norte da capital, e tem de visitar
clientes por toda a cidade de ônibus. Não é raro que ele leve até quatro
horas no transporte público para chegar até a região do M’ Boi Mirim,
na Zona Sul, ou duas horas e meia para ir até Jundiaí de trem para
atender pedidos. Ele tem cinco filhos com idades entre 2 meses e 14 anos
e praticamente tudo que ganha vai para sustentar a família. Quando
precisa de médico, joga nas mãos de Deus. “No Hospital de Taipas quase
não tem médico e os que estão lá vão em passo de tartaruga. É esperar
pra morrer em casa”, desabafou o montador.
‘Todo o trajeto de uma hora até o Metrô faço em pé e espremida como sardinha'
A estudante Gabriella Silva Aguilar Servilha, de 21 anos, mora em São
Mateus, na Zona Leste da capital, e trabalha na região da Paulista, no
Centro. Todos os dias, ela tem de encarar ao menos três horas para ir de
casa ao emprego, depois para a faculdade e, enfim, retornar ao lar.
“Antes havia várias opções de ônibus até o Metrô Vila Prudente ou o
Tamanduateí (estações da Linha 2-Verde), mas cortaram as linhas e agora
só tem um ônibus. Todo o trajeto de uma hora até o Metrô faço em pé e
esprimida como sardinha. O ônibus mesmo lotado vai parando em todos os
pontos”, contou a estudante, que acorda às 6h e chega em casa por volta
da 0h. Ao voltar para casa, Gabriella prefere ir da Brigadeiro Luís
Antônio, onde fica sua faculdade, até o Terminal Parque Dom Pedro II para
voltar direto de ônibus para casa. Na última terça ela resolveu ir de
Metrô, mas com o problema na Linha 3-Vermelha, foi até a Estação Sé e,
como ela estava fechada, teve de voltar para o Parque Dom Pedro 2 de
qualquer maneira. Acabou chegando em casa à 1h30.
‘Além de termos de subir uma rampa enorme, o médico não veio’
O aposentado José Pais de Lira, de 90 anos, estava com o médico marcado
havia dois meses e na semana passada havia chegado o dia da consulta.
Ele mora no Jardim Peri, na Zona Norte da capital, e a consulta era na
UBS de mesmo nome. Se arrumou para sair à rua:
calça social marrom, sapatos, camisa cinza clara e a velha bengala que o
ajuda a andar. A filha dele, Neusa Lira, de 65 anos, saiu de Pirituba,
onde mora, também na Zona Norte, com o marido e os dois de carro foram
até a casa do aposentado para acompanhá-lo na consulta. Assim que
desceram na UBS veio a primeira dificuldade: a unidade fica no segundo
andar do imóvel e é preciso subir três rampas para chegar à porta de
entrada. “Além de termos de subir uma rampa enorme, o médico não veio.
Agora a consulta foi adiada para o dia 12”, disse Neusa. Ao menos na
hora de esperar pelo marido de Neusa, que passaria para buscá-los com o
carro, já do lado de fora da UBS, José contou com a soliedariedade de
uma vendedora de sorvetes que emprestou seu banco para que ele
aguardasse sentado.
Fonte da Notícia: Diário de SP
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