Funcionário do Metrô toca cuíca na Mocidade Alegre (SP) |
De Junho até o Carnaval, o técnico Marcos Martins dos Santos, de 45
anos, divide suas noites entre os ensaios na quadra da escola Mocidade Alegre
e os túneis do sistema metroviário de São Paulo. Após as 22h, ele troca
a camisa da agremiação e a cuíca pelo uniforme do Metrô e a lanterna.
Com 17 anos de empresa, e quase uma década na função de técnico, o
paulistano da Zona Norte da cidade é um dos responsáveis por inspecionar
trechos das vias subterrâneas e equipamentos metroviários. "O serviço
que eu faço é vital para o bom funcionamento do sistema. Só quando a via
está sem energia que a gente entra para inspecionar", explica.
Na Mocidade desde 2013, é ritmista da bateria e resgatou as aulas de
cuíca, à época paralisadas por falta de professor, na escolinha de
música da agremiação. Com o trabalho, quer renovar a ala de cuiqueiros,
uma das mais difíceis de seduzir novatos não apenas pela complexidade do
instrumento.
“A cuíca é o instrumento mais melódico da bateria. É mais da velha
guarda, você não vê molecadinha tocando. E é um instrumento que a escola
não fornece. Você tem que comprar e fazer a manutenção do próprio
bolso", comenta.
Mal sabem que é orbitando neles que as musas do carnaval gostam de
gastar o requebrado. Casado há 28 anos, Marcos revela que sua mulher
ainda sente um certo desconforto com tal comportamento das beldades.
"Ela tem um pouco de ciúmes. A cuíca é a ala da bateria que sai na
frente. É onde tem nossa rainha de bateria, as passistas gostam muito do
som, quando tocamos para as passistas, a gente abaixa no chão para elas
sambarem. Mas ela viu que não tem mais jeito. E eu sou desencanado, eu
gosto mesmo é de fazer um som."
A cuíca foi um dos últimos instrumentos que o técnico aprendeu a tocar,
e o único que recorreu à ajuda de um professor (por dois meses,
apenas). Autodidata, aos 16 anos, ele começou tocando repique de mão
inspirado em um dos fundadores do grupo Fundo de Quintal. “Sempre tentei
copiar os movimentos e a batida que o Ubirany fazia”, explica.
Fã de samba e pagode, ainda adolescente ele encarou pandeiro, surdo,
tantan e tamborim. Em 1987, Marcos e o irmão mais velho se juntaram com
mais três amigos do bairro e fundaram o grupo Cabeça Feita.
Quando o grupo do Imirim começou a conquistar espaço com canções
autorais, Marcos já trabalhava no Metrô. Ficou três anos na dupla
função, até que em 1994 decidiu sair para investir na carreira musical. O
período era favorável: os contratos de shows cresciam, e passou a ficar
impossível conciliar dois trabalhos noturnos.
Gravaram discos e peitaram o auge do gênero no Brasil, disputando fãs
com Katinguelê, Sem Compromisso e Exaltasamba – bandas que também
emergiam no cenário. Dois anos depois, porém, a procura começou a
minguar. “A gente viajava, estava legal. Mas foi uma época muito
concorrida. Em 1996 eu abandonei o sonho de viver do samba", relata.
Em 2002, decidiu pleitear uma vaga no Metrô novamente. Prestou
concurso, foi aprovado em primeiro lugar e retornou à empresa de onde
não pretende sair tão cedo. Embora satisfeito na função, trabalha para
tentar viver de música futuramente. Desta vez, longe dos palcos.
“Minha ideia é conseguir aposentar no Metrô e estou tentando montar um
estúdio em casa para trabalhar como produtor musical. Tem muitas pessoas
de talento na noite sem oportunidade. Minha ideia é juntar essas
pessoas e poder produzir com um custo que seja bom pra todo mundo e ver
se consigo alavancar alguém.”
Fonte da Notícia: G1-SP
Imagem de Victor Moriyama
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